A FORMAÇÃO DO CONCEITO DE NÚMERO EM CRIANÇAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL:
O conhecimento de como acontece a formação do conceito de número em crianças
pequenas é de fundamental importância para a prática nas salas de aula da educação
infantil.
Os números estão presentes no cotidiano das crianças, desde muito cedo presenciam
e vivenciam ações de troca, venda, reunião e distribuição de objetos.
Lerner (1995) afirma que as noções matemáticas adquiridas nessas práticas informais
possibilitam às crianças realizar pequenos cálculos, selecionar canais de televisão,
comparar idades de seus familiares, reconhecer endereços, números de telefones entre
outros.
Para Kamii (2008, p.70): “[...] a criança não constrói o número fora do contexto geral
do pensamento no dia-a-dia [...]”.
No entanto, na escola, estas práticas não devem ser desconsideradas, pois obtém
importância em relevar conhecimentos prévios dessas crianças, sendo o ponto de
partida para futuras aprendizagens.
Podem ser proporcionados momentos de experiências diversificadas que promovam
habilidades de classificar, seriar e ordenar juntamente à uma metodologia que permita
às crianças encontrarem suas próprias soluções, que as debatam com os seus pares,
num pequeno grupo, ou mesmo com todo o grupo, apoiando a explicitação do porquê
da resposta num processo de reflexão.
Portanto, segundo Kamii (1995), a construção do conceito de número é construído por
cada criança a partir de todos os tipos de relações que ela cria entre os objetos. Dessa
maneira, a idéia de número é uma construção realizada pelo sujeito, e ocorre a partir
das inúmeras relações que ele estabelece na sua leitura de mundo.
Piaget (apud Dehaene, 1997) afirma que o conceito de número emerge aos quatro ou
cinco anos de idade, pois para ele a idéia de numerosidade estava construída sobre
conceitos lógicos considerados como pré-requisitos: o raciocínio transitivo, a
conservação do número e a habilidade de abstração. Ainda segundo Piaget (Dehaene,
1997), as crianças nascem sem nenhuma idéia pré-concebida sobre aritmética levando
anos de observação atenta antes que elas realmente entendam o que é número. Logo,
o conceito de número, assim como qualquer representação abstrata do mundo, deveria
ser construído nas interações sensório-motoras com o ambiente.
Em contrapartida, para Butterworth (1999) o entendimento de número pressupõe o
conhecimento de duas outras idéias: primeiro, a idéia de que um objeto é algo que pode
ser individualizado e formar uma coleção que possui uma numerosidade; e segundo,
ser capaz de determinar quando dois conjuntos possuem a mesma numerosidade e
quando um conjunto possui a numerosidade maior que outro conjunto.
1.1 RELAÇÃO ENTRE CONTAGEM E CONCEITO DE NÚMERO
As crianças desde muito pequenas podem contar muitas coisas. Estão em contato
com o mundo à sua volta e explorando diferentes materiais.
É muito comum observar episódios com crianças da Educação Infantil que dizem os
nomes dos números e que apontam objetos designando elementos de uma coleção.
Embora a criança demonstre um certo conhecimento numérico fica uma inegável
dúvida se já está formado o conceito de número, como faz refletir Moro (2004, p.29):
Quando as crianças contam muitas coisas, quando vão dizendo em ordem os
nomes dos números para poder contar corretamente uma coleção mais
numerosa, quando elas escrevem vários numerais, na ordem convencional
correta, elas já estarão tendo a compreensão do número¿
A aquisição das palavras iniciais “um, dois, três, quatro, cinco, seis, sete, oito, nove,
dez” envolvendo a sua real significação não faz parte, ainda, da compreensão das
crianças da Educação Infantil a respeito do número.
A aprendizagem do número requer aquisição de um campo de conceitos, de
representações gráficas e de organização de sentidos que implica longo e rico
caminhar das crianças desde muito pequenas.
A aprendizagem do “contar coisas” ocorre quando a solicitação do meio se faz
significativamente presente na vida das crianças, sobretudo quando a família e a escola
oportunizam situações para o “contar” e auxiliam na organização desta atividade.
A este respeito Moro (2004, p.29-30) diz que:
Esse aprendizado se faz deixando-se a própria criança fazer a contagem
conforme suas formas de contar, mesmo que estas formas sejas incompletas,
incorretas, limitadas a certas quantidades. Mas, também, é muito importante
que o adulto faça a contagem das coisas de forma correta para a criança poder
observar do que se trata. Fazer a criança contar e deixá-la contar conforme
sua capacidade do momento é algo indispensável para que ela tenha
progressos com os números. Somente assim ela estará construindo suas
primeiras idéias quantitativas: de que o mundo real pode ser quantificado, pode
ser medido, avaliado por meio dos números, o que muitos estudiosos chama
de “a aritmética natural das crianças”.
No entanto, segundo Kamii (2008) criança pequena não usa a estratégia de contagem
como uma ferramenta confiável, somente quando ela constrói a estrutura mental do
número e assimila as palavras a esta estrutura, então é quando a contagem torna-se
um instrumento confiável.
Portanto, a contagem oral não é a garantia de que a criança construiu a estrutura
mental e que percebeu a lógica de tal procedimento. O Referencial Curricular Nacional
orienta:
Embora a recitação oral da sucessão dos números seja uma importante forma
de aproximação com o sistema numérico, para evitar mecanização é necessário
que as crianças compreendam o sentido do que se está fazendo [...]
E ainda, segundo Piaget (PIAGET; SZEMINSKA, 1975, p.15): “Não basta de modo
algum à criança pequena saber contar verbalmente um, dois, três, etc. para achar-se na
posse do número”.
Embora a contagem seja uma das primeiras formas que a criança tem de entrar em
contato com o sentido de número não é suficiente e nem se põe como condição para
que isso aconteça.
Piaget (apud GOUBERT, 2002) demonstrou em suas investigações que para haver
compreensão dos números a criança precisa estabelecer a relação quantitativa entre
determinados elementos e o número correspondente a essa quantidade. Por exemplo,
a relação entre oito elementos e o número oito. Para chegar a esse entendimento, ela
deve fazer uma síntese operatória entre procedimentos de classificação e de seriação,
uma vez que o número designa “uma classe de objetos seriados”. O número cinco, por
exemplo, corresponde a uma classe de cinco elementos e, ao mesmo tempo, pertence
a uma série.
É importante perceber que o ato de contar é um processo gradual. Uma criança pode
contar perfeitamente cinco objetos colocados na horizontal e errar a contagem de cinco
objetos colocados em círculo, porém, isso não quer dizer que a criança não saiba
contar, segundo Fuson (1988) é mais fácil contar objetos arrumados horizontalmente do
que objetos arrumados em círculo. Ou seja, o arranjo espacial dos objetos influencia na
contagem.
Contudo, podemos pensar o desenvolvimento do sentido de número como criação de
conexões e relações flexíveis entre idéias e habilidades de caráter numérico-cognitivas
que podem, inicialmente, estar separadas e em um determinado contexto (Lefevre e
cols, 2006).